segunda-feira, 16 de março de 2009

Parte I das pequenas histórias sobre a felicidade

Hoje perguntaram-me que coisas me deixavam feliz. À falta de resposta imediata, propus-me a pensar e a imaginar cenários de bem estar e serenidade. Lanço o desafio a todos os que por aqui vão passando... Quais são as coisas que vos fazem felizes?

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Dia de piquenique. Três horas, a relva parecia reluzente e fresca; bastava passar o vento para que a cor ondulasse entre a discrição e a excentricidade. A toalha branca estava estendida, como se aquele fosse o seu lugar desde sempre e não outro para além daquele. O ruído abandonara há muito aquele local, fazendo questão de deixar suspenso apenas o som do Verão entre o assobio dos melros e o riso distante de três ou quatro crianças cujos pés estavam descalços. Dentro da cesta de verga, havia uma garrafa de vinho e algumas maçãs.

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Quando o dia decide findar em tons de púrpura, o regresso a casa mostra-se inevitável, mesmo quando a vontade nos desafia a mais umas horas de conversa fiada. A travessia é geralmente solitária. Mas há dias, aqueles dias, em que o acaso transforma o regresso a casa no mais terno momento da jornada. Aqueles dias em que inesperadamente a viagem de comboio nos entrega um amigo como brinde.

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O salão estava quase deserto. Três ou quatro luzes faziam sentir-se no meio do fumo. A música lembrava anos que não os de agora. Três mulheres sentadas, copos e cigarros na mão. A linguagem corporal correspondiam à deselegância de não saber o que fazer. Castiças! Bocas vermelhas e sem saber onde pôr as mãos. No fundo do salão uma cortina pesada de veludo vermelho escondia objectos velhos. De súbito, uma mulher e um homem acompanham, quais bailarinos de longa data, a fanfarra gravada e emitida por umas colunas de fraca qualidade. As três mulheres sentadas, ficam perdidas, em suma, deslumbradas pela visão do amor.

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Os pais não estavam em casa e as desculpas para evitar aquele segundo em que o desejo atravessa a razão acabariam por se esgotar mais cedo ou mais tarde. Puxaram as cortinas até meio das janelas para que a sua viagem não fosse a perda de pudor dos vizinhos. Deixaram instalar a música do desconforto. Primeiro tiraram as camisolas e observaram-se como se aquela fosse a primeira vez. Em poucos minutos, não havia nada que lhes cobrisse os tenros corpos. A vergonha impediu-os de avançar até que as consequências fossem últimas. Sem pudor e sem falar, deram as mãos e adormeceram. O que havia para dizer, foi dito durante o sono.

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O que havia de melhor nas suas idas ao teatro era esperar que todos saíssem da sala para que, por fim, ele pudesse ver toda a magia quebrar-se no escuro.


3 comentários:

Catarina disse...

Faz-me feliz ter a noção de que me sinto feliz simplesmente porque sim, porque, em efémeros estados de perfeita lucidez, sei que é a melhor alternativa.

Faz-me feliz poder realizar os meus maiores desejos espontâneos mais simples, como a semana passada, com um gelado de framboesa.

E ler. E de andar pela primeira vez com os pés despidos na rua depois de meses de botas forradas de antecipação.

Fazer as malas. Para férias. E fazer a lista dois meses ou mais antes de partir.

Dançar deixa-me feliz. Um dia com os meus amores-perfeitos deixa-me feliz. Conversas que parecem odisseias, que começam num sentido, se desregulam e retomam num outro ponto qualquer, deixam-me feliz. Sentir-me a crescer deixa-me feliz. Reconhecimento deixa-me feliz. Ver as minhas pessoas do coração felizes deixa-me muito feliz. Desenhar descontroladamente deixa-me feliz. Tirar uma boa fotografia deixa-me feliz. Ver menos numeros na balança sem me dar conta faz-me feliz. Nao tem fim, vendo bem as coisas.
Não tem comparação a dimensão disto com o oposto. Não tem mesmo.

Beijo grande

• pO • disse...

obrigada pelo desafio, já sei o que me faz feliz! Entre tantas outras coisas...

Laura Ferreira disse...

Gostei imenso desta escrita.
Se me deixares, voltarei.