quinta-feira, 18 de setembro de 2008

a guerra e o Homem: os inevitáveis encontros de Maria e José

M deixara a sala escura e húmida onde encontrara o Homem. Lembrava-se vagamente de umas paredes azuis. A luz era pouca, talvez uma cave, um sótão. Era difícil situar a sala, as memórias dissipavam-se rapidamente, como se o encontro não tivesse acontecido: a memória única que permanecia em ebulição era a de umas paredes altas e azuis que consumiam todo o espaço. Onde? M seria incapaz de regressar lá sozinha.

Pela primeira vez M sentia uma certa inquietação ao pensar no Homem: ele falara-lhe de uma guerra que ela não desejaria travar com ele. Preferia antes trava-la com J, mesmo que ele preferisse um acordo de paz. Imaginava-se em cima de um tanque, de um gigante tanque a entrar na copa de um restaurante saqueando copos e pratos, garrafas de whisky adulterado e facas de ponta aguçada. Imaginava como isso perturbaria J e que isso o faria segui-la até ao fim da viagem. Mas J estava desaparecido e M sentia a angústia dessa ausência. Não podia recuperar nada que lhe pertencesse. Para além de um rendez-vous ocasional, M apenas tinha esperado por J em frente a uma cabine telefónica. Sentia-se terrivelmente apaixonada: ele era um homem, as mãos dele suavam e o cabelo desalinhado caía-lhe sobre a testa, tinha os lábios grossos e um corpo sem fim. Não havia poesia nos seus gestos, muito menos encantamento. Todo ele eram batalhas de dureza e virilidade infantil por travar e isso transformava M numa mulher de armas, pronta a atravessar corpos com tiros de pólvora quente, pronta a deixar-se abandonar no meio de tantos outros cadáveres mutilados pela guerra.

J não aparecera com as armas, tinha faltado ao compromisso de honra de um soldado. M tinha todas as armas nas mãos; ninguém para matar.

Entretanto o Homem esperava M bem de perto com uma granada na mão.

-Homem: Quando me encontrares numa rua estreita serei o primeiro a dar-te a mão. Sempre te soube pronta para um mergulho num corpo desconhecido, sempre te conheci querendo a grande guerra eclodindo nos teus cabelos. Agora estou aqui, regresso aos teus passos e tu esqueceste o meu nome. Eu não me recordo também. Apaguei o meu nome para poder dar lugar ao amor estéril que é o nosso. Não sei o que há em ti que te transforma num voo mais profundo que todas as rosas. Estranha, funda criatura. Enquanto não chegares terei o dedo pronto para pressionar o gatilho. O relógio está em contagem de-crescente. Só faltam dez estações até chegar ao centro da cidade envenenada. Declaro-me em guerra com o amor...

3 comentários:

Catarina disse...

estou a ansiar pelo proximo encontro de M e J.
Beijo grande I

TEATCHA disse...

Olha olha quem tem um blog!!! Um beijo do Teatcha...

Ágnes disse...

Dores de cabeça me têm dado esses dois, querida Cathe! Dores de cabeça!

Quanto a ti querido Teatcha, espero ver-te por aqui mais vezes. Eu tenho-te visto, desse lado! Sou uma "BISBILHOTEIRA"!

Até ja